DARUEIRA, OS GUADIÕES DA SABEDORIA.NÃO FOI UM SONHO... E MUITO MENOS REALIDADE.
DARUEIRA, foi minha banda de garagem, não era propriamente uma garagem nosso local de ensaio, era só um quarto que sobrava em minha casa, e que servia de depósito de tudo, logo os bagulhos deram lugar aos instrumentos, e os ensaios musicais revestidos de uma misteriosa mística tomavam conta do lugar.
Wagner Jales a muito queria reunir seus dois amigos com os quais tinha mais afinidade musical, para uma espécie de experimentalismo sonoro. Foi assim, que em certa tarde levou o Ricardo Passos em minha casa e me apresentou. Já tinha falado para o Ricardo das minhas canções e de minhas letras, e eu já tinha ouvido sobre suas habilidades de instrumentista. Os três reunidos, meu violão e o de Wagner e as flautas improvisadas de bambu e cano de PVC, do Ricardo, foram suficientes para nossa primeira jam.
Afinidades musicais nem tanto, havia uma certa congruência de influências musicais diversificadas: O Wagner, aos doze anos de idade já tocava MPB nos bares da Avenida Litorânea a revelia dos pais e do juiz da infância e juventude, ouvia basicamente cantorias, musica armorial, curtia o Lenine, o Almir Sater,o Luiz Gonzaga, o Xangai e o Elomar; o Ricardo veio de uma banda de Rock Industrial que atendia por um nome em inglês que se traduzia por “pele morta e fria”, ouvia música romântica clássica, música do mundo e coisas do gênero; Eu que vinha da ingênua banda "Os Brasas", formada por mim, meu irmão Gorge Castro (que atualmente se dedica a música cristã) e Glad Azevedo (cantor e compositor maranhense que agora está abrindo caminhos para a sua música no cenário nacional), gostava de MPB e Pop Rock, principalmente o nacional dos anos oitenta, e escrevia músicas com melodias simples e letras irreverentes, um pouco de Raul Seixas, Tom Zé e outros desconformes.
As tardes de sábado foram agendadas para os ensaios, que não eram propriamente ensaios, pois não haviam músicas para serem ensaiadas, tudo o que agente tinha eram alguns temas que íamos desenvolvendo a cada encontro.Não havia o sonho Pop star, aquela coisa de gravar CD, DVD, tocar na televisão, e vender camisetas, havia apenas a vontade de criar, de inventar, experimentar os sons, os ritmos, as idéias.Não se elaborava letras, não existiam músicas inteiras, escritas, elaboradas, eram simplesmente os temas que se desenvolviam livremente, se transformavam, se reproduziam. Um improviso sobre o próprio improviso, nada concreto.
Logo veio o meu contra-baixo semi-acústico, ou baixolão, para os que assim preferirem, o violino de Ricardo e a viola de Wagner, e, em alguns ensaios tiveram participações honrosas como a do Junior Gaiatto e o do Ivaldo.Não havia definição de estilo no som que fazíamos, tinha um pouco de progressivo, um pouco de blues, de jazz, e nada de tudo isso, tinha por assim dizer uma vivência de elementos sonoros nordestinos, referências nítidas no movimento armorial.Fazer Word Músic, era uma idéia, mas não um objetivo, como também não era objetivo rotular de qualquer coisa a música que produzíamos.
Certa tarde Wagner trouxe um CD que tão simplesmente reproduzia o som das marés, real, puro, sem nenhum elemento sintético. Tocávamos inspirados no barulho das ondas buscando usá-las como contratempo, logo o guitarra de Wagner reproduzia o som dos golfinhos, e baleia orca emitia seus sinais sonoros através da flauta que Ricardo tirou de algum encanamento. E assim, viajávamos no meio das ondas cercados de golfinhos e baleias assassinas.
O tempo, o recomeçar, a rotina, foi outro tema que o Wagner trouxe para experimentá-lo, fazíamos passagens sincopadas, teimosas, ganhavam força e velocidade cada vez que eram repetidas, foi assim, que certa vez a criatura se libertou, foi mais forte e dominou os criadores. Tocávamos freneticamente, e a música por si só criou vida, seguiu sozinha, mal podíamos acompanhá-la, a cada momento vinha uma nova possibilidade sonora, e nós a buscávamos instintivamente, sem racionalizar e nem questionar nada, a música respirava, estava presente, era uma força da natureza, gerando e sendo gerada, um ser místico se manifestando quase de forma sobrenatural. Nos entreolhamos e de imediato largamos os instrumentos que pareciam tocar sozinhos, nos rosto de cada uma havia uma expressão inequívoca: estávamos perplexos!
Ana e a Lua do compositor maranhense Betto Pereira, apareceu em nosso repertório, adaptada, com uma letra épica onde Ana se aventurava entre minotauros e outros seres oriundos da mitologia greco-romana.
Mais tarde fizemos experiências percussivas, usamos baldes plástico, que eram muito úteis com a constante falta d’água, a qual éramos submetidos lá em casa, e um pote que até virou abrigo de um gato assombrado(mas isso é outra estória).
No meio dessas experiências percussivas começamos a entonar uma palavra como elemento da música: DARUEIRA.... OH! DARUEIRA...., a palavra chapou de vez e foi assim que a nossa Jam escolheu o seu nome extraído de sua própria sonoridade.Buscamos no vernáculo Tupi-Guarani o significado para a palavra Darueira e ficamos sabendo que era “GUARDIÕES DA SABEDORIA”, batizamos assim a banda e o estranho som que fazíamos.Surgiu então a nossa primeira música com letra, um reggae chamado “O filho do Rei”, com uma letra filosoficamente rastafari, falávamos de Deus, de religião, negritude e preconceito, diferenças sociais e opressão, a letra se estendia por várias folhas de papel A4, e desapareceu mais tarde, quando a banda acabou, pois cada um de nós só lembrava de alguns trechos.
A Darueira acabou da mesma forma que todas as bandas de garagem acabam, alguns desentendimentos, a vida segue seu rumo, surge família, emprego, faculdade, viagens, novos objetivos e cada um busca o que é seu.Tudo o que foi dito aqui aconteceu, mais ou menos como foi dito, foi real e imaginário, não mudou o mundo (se bem que poderia) mas mudou nossas vidas, crescemos culturalmente e musicalmente de uma forma que não teria acontecido se tivesse sido diferente. Viajávamos como o nosso som, tão somente. Quase ia me esquecendo: ninguém fumou nada, viu!
A Darueira acabou da mesma forma que todas as bandas de garagem acabam, alguns desentendimentos, a vida segue seu rumo, surge família, emprego, faculdade, viagens, novos objetivos e cada um busca o que é seu.Tudo o que foi dito aqui aconteceu, mais ou menos como foi dito, foi real e imaginário, não mudou o mundo (se bem que poderia) mas mudou nossas vidas, crescemos culturalmente e musicalmente de uma forma que não teria acontecido se tivesse sido diferente. Viajávamos como o nosso som, tão somente. Quase ia me esquecendo: ninguém fumou nada, viu!
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