sábado, 5 de março de 2011

DONA DA PRIMAVERA



Antes do sol raiar a mulher amanhece
Com cheiro de café tempera o dia
Com afago desperta a cria
Com um beijo difunde o riso
Começa a luta
Lá fora o batente a espera
Ocupa o lugar que antes não era dela
Causando espanto nos olhos de quem a desdenha.
Antes era só linda.
Hoje sabe, mais ainda...
E ensina.
A primavera lhe pertence
Não lhe foi dada, foi conquistada.
As que apanharam, as que foram torturadas.
As que sofreram abusos, as que foram assassinadas.
As que foram descartadas ou trocadas.
As que tiveram o coração dilacerado:
As mães da praça de maio
Ou dos meninos da candelária,
Maria da Penha, Margarida, Maria Mineira Naê,
Olga, Joana D’arc, Maria, a mãe do nazareno sacrificado.
A operária,
A mãe solteira,
A desempregada,
A prostituta desvalida,
A doméstica confundida,
A dona de casa, a subordinada.
As que receberam flores,
Têm sua primavera!
As que cultivam o jardim,
Têm sua primavera!
As que simplesmente colhem,
Têm sua primavera!
Até as que desfolham um mal-me-quer,
Também têm sua primavera!
No fim da tarde para casa retorna,
Um outro trabalho a espera
É o filho que chora inconformado,
Enquanto a casa e o mundo estão às avessas.
A mulher chora por qualquer bobagem:
Pelo marido que saiu só para comprar um cigarro e não voltou,
Pelo filho que tem febre,
Pelo pão que falta,
Pela oportunidade que não veio,
Pelo carinho que com o tempo foi se perdendo,
Pela dor de cabeça que só ela sente,
Por que só ela se aborrece,
Só ela lembra a data do aniversário de casamento,
Só ela quer discutir a relação,
Só ela controla os gastos...
Então ela chora
Porque tem coragem,
Porque ela pode,
Porque ela quer,
Porque ela consegue
A mulher chora...
E depois adomerce!